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Por que me tornei vegetariana: Favali

No começo, queria me desafiar. Mas depois entendi que era um ato de princípios, ideologia, política e amor.


Quando eu era pequena, se alguém me perguntasse o que queria ser quando crescesse, eu respondia de prontidão: veterinária. Porque? Porque amava animais. Mas ai descobri que as coisas não funcionavam BEM assim, e que era mais fácil encher a casa de cachorros, gatos e tartarugas do que ficar costurando bichinhos, já que eu odiava sangue. E em uma dessas minhas loucuras de criança, de bater o recorde de animais dentro de um quarto, ganhei um peixe. Mas chorei dois dias seguidos porque achava que ele não merecia ficar preso naquele aquário. Conclusão: joguei-o na privada, crente de que assim, iria parar no mar. PS: não devia ter assistido Procurando Nemo uns dias antes. Mas mesmo tendo aflição de sangue e dó de ver animais sofrendo, eu sempre achei muito normal comer carne. Fazia parte da rotina. “O que tem pra comer? Carne”. Parecia que as refeições não teriam graça, nem sentido se não houvesse uma carne inserida. Faltava algo.


Antes de virar vegetariana não sabia cozinhar e a minha única especialidade era: bife. Porque era simplesmente jogar na frigideira e deixar lá. Cheguei a fazer aquela dieta dukan, numa fase louca da adolescência e comia tanta comida de origem animal que mal conseguia ir ao banheiro. E foi então que eu parei e pensei: tem algo errado ai.


Mas era fácil, prático e tão inserido na sociedade, nos comerciais de TV e nas rodas de amigos, que passou. Sempre ouvia piadinhas sobre vegetarianismo, e sobre o quão errado era não comer carne, até cheguei a falar “Acho muito legal ser vegetariano, mas nunca vou conseguir ser”. Engraçado como a gente muda. Na faculdade e no trabalho, conheci uma galera que adotou esse estilo de vida e sempre conversávamos sobre isso. Achava incrível, admirava mesmo, mas parecia utópico demais pra quem mal conseguia ficar uma semana sem comer chocolate, mesmo fazendo promessa. Foi quando uma noite, estava esperando alguns amigos perto de um Mc Donalds, e o grupo Não Mate estava expondo vídeos, informações e distribuindo materiais para alertar sobre a indústria da carne. Aquilo ficou no meu subconsciente e me peguei pensando sobre o assunto durante uns bons dias. E foi de repente, em um almoço onde olhei para o meu prato e pensei “eu não preciso disso”, que decidi não comer mais carne. Acho que no começo foi mais pelo senso comum de me desafiar, provar que conseguia, tentar algo novo, não sei. Só depois de alguns meses já sem comer carne, que fui procurar sobre o assunto, ler, estudar, ver alguns documentários, ter conversar mais profundas e entendi que era muito mais que isso. Era questão de princípios, crença e ideologia, política. Eu não queria mais um animal morto no meu prato.


Não é fácil, vamos admitir. Meu pai é apaixonado por churrasco, todas as especialidades da minha mãe pareciam envolver carne, os almoços e datas em família. Pascoa: Bacalhau. Natal: Peru. Ano novo: Salmão. No começo você parece não ter opção, mas depois percebe que é incrível a variedade da cozinha vegetariana. Hoje eu amo cozinhar e como muito melhor do que antes. Presto mais atenção no meu prato, e me sinto mais leve. Nunca assisti documentários muito chocantes, pelo contrário. Preferia ver aqueles clichês fofos de porcos e vacas amorzinhos que já me derretia e tinha certeza do que estava fazendo. Como sempre gostei de comer, e como na nossa cultura o ato de sentar à mesa tem um certo peso, nada mais justo que fazer isso de consciência limpa e tendo prazer. Três leituras foram essenciais na caminhada: Porque Amamos Cachorros, Comemos Porcos e Vestimos Vacas e Comer Animais, onde os relatos e revelações me chocaram e me deram total certeza do que estava fazendo, e do que nunca mais voltaria a fazer. O terceiro foi A Profecia Celestina. Como sou muito ligada a fé, espiritualidade e evolução, a obra aponta que, deixar de comer produtos de origem animal ajuda na evolução do ser, na busca pela paz de espírito e das fontes de energia naturais que nos abastecemos, fiquei ainda mais satisfeita. Carimbei no meu caderno de certezas que não voltaria a comer carne.


Às vezes o ser humano é tão hipócrita. Achamos que por usarmos roupas, planejarmos metas e criarmos coisas, podemos nos colocar no topo da cadeia alimentar como mais importante e matar e comer tudo que bem entender. Fora os zoológicos e aquários né? Que ninguém nunca fala. Prender animais para admirá-los quando estivermos com vontade, sem pensar. Só assim. Por instinto. Instinto esse que nem os animais tem. Porque afinal não estamos falando de sobrevivência, e sim de luxo, de um capricho, de gula. Ou sei lá do que. A indústria da carne é bem pobre, negamos isso, ignoramos e aceitamos não pensar sobre. Mas a partir do momento que você reflexe, o amor é maior do que a vontade de comer um hambúrguer ou um bacon. Eu ser uma pessoa que usa roupa e tem um celular não me faz melhor do que meus gatos, por exemplo. E a gente vai entendendo, com o passar do tempo, que muitas vezes o que está inserido em nossas rotinas, nem sempre vai ao encontro do que acreditamos. E isso é ótimo, te desperta senso crítico e faz você pensar duas vezes antes de tomar qualquer passo, seja com um animal no seu prato, com um animal na sua casa, na rua, ou com o seu próximo. A gente se torna mais humano, migra do micro para o macro a partir do momento que se sente livre pra tomar nossas próprias escolhas, sem amarras, sem tabus, sem sofrimento.


Amanda Favali


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